Quórum para excluir sócio majoritário por falta grave dispensa maioria de capital social

Com base na possibilidade de que os sócios minoritários tomem a iniciativa de excluir judicialmente o sócio majoritário que pratique falta grave como administrador da empresa, conforme estipula o artigo 1.030 do Código Civil, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve determinação de exclusão de cotista que, de acordo com os autos, praticou concorrência desleal contra a sociedade. A decisão foi unânime.

Na ação que originou o recurso, os autores alegaram que o sócio majoritário da sociedade também era administrador de outra empresa atuante no ramo imobiliário, o que caracterizaria concorrência desleal contra o grupo empresário.

O magistrado de primeiro grau julgou procedente o pedido e determinou a exclusão do sócio majoritário do quadro societário, com a consequente redução do capital social correspondente às cotas do sócio excluído. Em relação à exclusão, a sentença foi mantida pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais.

Por meio de recurso especial, o sócio majoritário alegou que o artigo 1.030 do Código Civil – que prevê a possibilidade de exclusão judicial do sócio mediante iniciativa da maioria dos demais sócios nos casos de falta grave – deveria ser interpretado em conjunto com o artigo 1.085, com a consequente exigência de iniciativa dos sócios detentores da maioria do capital social.

Preservação da empresa

O relator do recurso, ministro Villas Bôas Cueva, destacou que, conforme estabelece o Enunciado 216 da III Jornada de Direito Civil, o quórum de deliberação previsto no artigo 1.030 do CC/2002 é de maioria absoluta do capital representado pelas cotas dos demais sócios, excluídas aquelas pertencentes ao sócio que se pretende excluir.

Com base na legislação e na doutrina, o ministro explicou que o artigo 1.030 traz a possibilidade de que os sócios minoritários também possam tomar a iniciativa de exclusão do sócio majoritário que pratique falta grave no cumprimento de suas obrigações, desde que devidamente comprovada a falha do cotista. Nesses casos, todavia, a exclusão só pode ser realizada pela via judicial.

“Assim, na exclusão judicial de sócio em virtude da prática de falta grave, não incide a condicionante prevista no artigo 1.085 do Código Civil de 2002, somente aplicável na hipótese de exclusão extrajudicial de sócio por deliberação da maioria representativa de mais da metade do capital social, mediante alteração do contrato social”, ressaltou o relator.

No voto que foi acompanhado de forma unânime pelo colegiado, o ministro também destacou que conclusão diferente implicaria a impossibilidade de exclusão judicial do cotista majoritário, mesmo que fossem nocivos seus atos à frente da empresa. Para o relator, essa hipótese não seria compatível com o princípio da preservação da empresa.

RESP 1653421

COMENTÁRIO

A exclusão do sócio é um direito da própria sociedade de se defender contra aqueles que põem em risco sua existência e sua atividade. É um direito inerente à finalidade comum do contrato de sociedade, independentemente de previsão contratual ou legal[1].

Tal exclusão se justifica pelo princípio da preservação da atividade exercida pela sociedade, isto é, por razões de ordem econômica que impõem a manutenção da atividade produtora de riquezas, em virtude dos interesses de trabalhadores, do fisco e da comunidade. O ordenamento jurídico deve assegurar os meios capazes de expurgar todos os elementos perturbadores da vida da sociedade, uma vez que a sua extinção pode afetar os interesses sociais na manutenção da atividade produtiva[2].

E não se diga que se trata de uma medida drástica contra os sócios, que teriam interesses que devem ser respeitados. Conforme se verá, a exclusão não é imotivada, e o motivo dela faz com que prevaleça o interesse da sociedade em detrimento do interesse individual do sócio, ainda que majoritário, “cuja presença é elemento pernicioso para o seu normal funcionamento e para a prosperidade da sua empresa”[3].

São possíveis motivos da exclusão: (a) grave inadimplência das obrigações sociais; (b) incapacidade superveniente; (c) impossibilidade do pagamento de suas quotas.

Consagrando-se como regra a exclusão judicial de um sócio, é imprescindível o ajuizamento de uma ação, tendo em vista o princípio dispositivo que rege o processo civil. Tal ação tramitará pelo rito ordinário, terá como autora a própria sociedade e como réu o sócio cuja exclusão é pretendida.

O direito de excluir o sócio faltoso é da sociedade e não dos demais sócios[4], por isso esta é a autora da ação de exclusão. Em função dessa titularidade do direito à exclusão, é necessário que a sociedade delibere o ajuizamento da ação. Para se decidir pelo ajuizamento da ação, é necessária a concordância da maioria absoluta dos sócios, computados pela participação no capital social, conforme a opinião majoritária[5], não sendo incluído na votação o sócio a ser excluído[6].

Especificamente em relação às limitadas, o Código Civil admite a exclusão extrajudicial de um sócio por justa causa, desde que haja previsão no contrato social admitindo tal despedida (art. 1.085). Tal exclusão deverá ser deliberada pela maioria de todo o capital social, em assembleia convocada especificamente para tal finalidade, com a notificação do sócio para, querendo, comparecer e exercer o direito de defesa. Essa hipótese exige a deliberação de maioria de todo o capital social, abrangendo apenas os sócios minoritários.

[1] NUNES, A. J. Avelãs. O direito de exclusão de sócios nas sociedades comerciais. São Paulo: Cultural Paulista, 2001, p. 61-62.

[2] NUNES, A. J. Avelãs. O direito de exclusão de sócios nas sociedades comerciais. São Paulo: Cultural Paulista, 2001, p. 58; BERTOLDI, Marcelo M. Curso avançado de direito comercial. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, v. 1, p. 229.

[3] NUNES, A. J. Avelãs. O direito de exclusão de sócios nas sociedades comerciais. São Paulo: Cultural Paulista, 2001, p. 58.

[4] NUNES, A. J. Avelãs. O direito de exclusão de sócios nas sociedades comerciais. São Paulo: Cultural Paulista, 2001, p. 253; CARVALHOSA, Modesto. Comentários ao Código Civil. São Paulo: Saraiva, 2003, v. 13, p. 323.

[5] Enunciado 216 das III Jornadas de Direito Civil do CJF; LORDI, Luigi. Istituzioni di diritto commerciale. Padova: CEDAM, 1943, v. 1, p. 223; MAMEDE, Gladston. Direito empresarial brasileiro. São Paulo: Atlas, 2004, v. 2, p. 160; BORBA, José Edwaldo Tavares. Direito societário. 8. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p. 79; WALD, Arnoldo. Comentários ao novo Código Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2005, v. XIV, p. 238; VERÇOSA, Haroldo Malheiros Duclerc. Curso de direito comercial. São Paulo: Malheiros, 2006, v. 2, p. 153.

[6] FERRARA JUNIOR, Francesco; CORSI, Francesco. Gli imprenditori e le società. 11. ed. Milano: Giuffrè, 1999, p. 330; JAEGER, Pier Giusto; DENOZZA, Francesco. Appunti di diritto commerciale. 5. ed. Milano: Giuffrè, 2000, p. 365; GALGANO, Francesco. Diritto civile e commerciale. 3. ed. Padova: CEDAM, 1999, v. 3, tomo 1, p. 390; NUNES, A. J. Avelãs. O direito de exclusão de sócios nas sociedades comerciais. São Paulo: Cultural Paulista, 2001, p. 262; PIMENTA, Eduardo Goulart. Exclusão e retirada de sócios: conflitos societários e apuração de haveres no Código Civil e na Lei das Sociedades Anônimas. Belo Horizonte: Mandamentos, 2004, p. 84.

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