Deferido o registro da marca, o seu titular passa a ter direito de uso exclusivo sobre ela em todo o território nacional.[1] Quem registra a marca tem direito de utilizá-la exclusivamente, não se permite que ninguém use a marca sem a sua autorização. Também são prerrogativas do titular da marca: a cessão do registro ou do pedido de registro; a licença do uso da marca; e o cuidado pela integridade material e reputação da marca. Todavia, a proteção assegurada pelo registro da marca não é absoluta, não devendo dar margem a abusos, e por isso não permite: (a) que se impeça o uso de sinais dos comerciantes junto com as marcas, na promoção e na comercialização; (b) que se impeça que os fabricantes de acessório indiquem o destino, desde que não violem a concorrência desleal (c); que se impeça a circulação da mercadoria, posta no mercado por si, ou com seu consentimento; (d) que se impeça a citação da marca em publicações, nas quais não haja uma conotação comercial.
A proteção conferida pelo registro da marca abrange o direito de impedir o uso de marca idêntica ou semelhante, que possa gerar confusão sobre a marca, ou sobre a proveniência do produto ou serviço. Esse é o aspecto mais importante da proteção decorrente de uma marca registrada. Havendo risco de confusão, o titular da marca tem direito de impedir o seu uso. Há risco de confusão quando “a semelhança entre as marcas em questão possibilite que um sinal seja tomado pelo outro ou que o consumidor considere que há identidade de proveniência entre produtos ou serviços que os sinais identificam”.[2] Deve-se analisar a visão do público em relação às marcas.
Havendo reprodução total da marca, isto é, cópia idêntica, não há dúvida do risco de confusão, porquanto é da natureza da reprodução a identidade entre as marcas.[3] No caso de reprodução parcial, o que se veda é a reprodução do verdadeiro elemento identificador do produto ou serviço, daquele elemento que é essencial para distinguir o produto ou serviço.[4] Em qualquer hipótese, é certo que o acréscimo de certos termos à marca não retira o risco de confusão, a menos que se revista de suficiente caráter distintivo.
Também pode haver risco de confusão nos casos de imitação, isto é, quando houver semelhança entre as marcas capaz de gerar dúvida no espírito do consumidor sobre a identidade de proveniência entre produtos ou serviços que os sinais identificam. A imitação pode decorrer das mais diversas formas, sendo impossível enumerar todas, cabendo destacar as mais comuns, que são a semelhança ortográfica, a semelhança fonética e a semelhança ideológica.
Em todos esses casos, o titular do marca terá direito de impedir que outras pessoas usem marcas idênticas ou semelhantes às de sua titularidade. Se o pedido consistir apenas nessa abstenção de uso, a competência será da justiça comum estadual. Todavia, se a ação tiver por objeto a declaração da nulidade da marca registrada por outra pessoa que vem sendo usada indevidamente, tal competência será da justiça federal, tendo em vista a obrigatoriedade da intervenção do INPI. No caso de cumulação dos pedidos a competência será da justiça federal, tendo em vista a participação obrigatória do INPI.
Para os demais sinais distintivos, como o nome empresarial, o nome de fantasia e o trade dress (conjunto imagem), a competência será sempre da justiça comum estadual, pois não interesse do INPI nesse tipo de demanda.
ROCESSO | REsp 1.527.232-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, por unanimidade, julgado em 13/12/2017, DJe 05/02/2018 |
RAMO DO DIREITO | DIREITO PROCESSUAL CIVIL, DIREITO EMPRESARIAL |
TEMA | Trade dress. Proteção legal. Teoria da concorrência desleal. Competência da Justiça estadual. Registro de marca. INPI. Atribuição administrativa. Uso da marca. Abstenção. Consectário lógico do ato administrativo. Justiça Federal. Competência privativa. |
DESTAQUE |
As questões acerca do trade dress (conjunto-imagem) dos produtos, concorrência desleal e outras demandas afins, por não envolver registro no INPI e cuidando de ação judicial entre particulares, é inequivocamente de competência da Justiça estadual, já que não afeta interesse institucional da autarquia federal. No entanto, compete à Justiça Federal, em ação de nulidade de registro de marca, com a participação do INPI, impor ao titular a abstenção do uso, inclusive no tocante à tutela provisória. |
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR |
A questão controvertida principal – único objeto da afetação ao rito dos recursos repetitivos – consiste em delimitar a competência da Justiça estadual para: a) em reconhecimento de concorrência desleal, determinar a privação de uso de elementos que não são registrados no Instituto Nacional de Propriedade Industrial – INPI, caracterizados pelo “conjunto-imagem” (trade dress) de produtos e/ou serviços e b) impor abstenção de uso de marca registrada pelo INPI. Quanto ao primeiro questionamento, vale destacar que a Terceira Turma desta Corte, em recente precedente, entendeu – entre outros pontos – que o conjunto-imagem de bens e produtos é passível de proteção judicial quando a utilização de conjunto similar resulte em ato de concorrência desleal, em razão de confusão ou associação com bens e produtos concorrentes (REsp 1.353.451-MG, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, DJe 28/9/2017). Com efeito, embora o sistema brasileiro não reconheça a proteção exclusiva do trade dress ou “conjunto-imagem” integral, com todos os seus elementos característicos, sua tutela tem origem na própria Constituição Federal, por meio do art. 5º, XXIX, ao afirmar que a lei assegurará a proteção às criações industriais, à propriedade de marcas, aos nomes de empresas e a outros signos distintivos. De fato, o que se efetiva, normalmente, é o registro da marca perante o INPI em sua apresentação nominativa (ou seja, somente o nome do produto, sem qualquer estilização), inexistindo especial atenção no sentido de se proteger os demais elementos do trade dress, a saber: o registro da embalagem como marca mista (seus logotipos, desenhos e demais caracteres gráficos), ou, ainda, como desenho industrial, nas hipóteses previstas na Lei de Propriedade Industrial. Destarte, cumpre observar que as questões acerca do trade dress (conjunto-imagem) dos produtos das recorrentes, por não envolver registro no INPI e se tratar de demanda entre particulares, é inequivocamente de competência da Justiça estadual, já que não afeta interesse institucional da autarquia federal. Situação diversa diz respeito a demanda referente à concorrência desleal, em que os litigantes são efetivamente proprietário das marcas que utilizam, devidamente registradas no INPI, embora tanto a marca como o conjunto-imagem sejam questionados por suposta confusão/associação entre produtos e o consequente desvio ilícito de clientela. Nesse contexto, importa destacar que os arts. 129 e 175 da Lei n. 9.279/1996 dispõe, respectivamente, que os registros de marca deferidos pela autarquia federal (INPI) conferem uso exclusivo ao seu titular em todo o território nacional, bem como que eventual ação de nulidade do registro será ajuizada no foro da Justiça Federal. Sendo assim, quanto ao pedido de abstenção de uso da marca, dúvida não há quanto à competência da Justiça Federal – sob pena de ofensa aos referidos dispositivos de lei federal –, sendo a abstenção de uso da marca uma decorrência lógica da desconstituição do registro sob o fundamento de violação do direito de terceiros – consequência expressa, inclusive, no parágrafo único do art. 173 da Lei de Propriedade Industrial. Conclui-se, portanto, cumprir ao Juízo federal analisar o pedido de abstenção de uso tão somente nos estritos limites daquilo que compõe o registro marcário anulando, relegando para a Justiça Comum todo e qualquer aspecto relacionado ao conjunto-imagem (trade dress). |
[1] VERÇOSA, Haroldo Malheiros Duclerc. Curso de direito comercial. São Paulo: Malheiros, 2004, v. 1, p. 335.
[2] OLIVEIRA, Maurício Lopes de. Propriedade industrial: o âmbito de proteção da marca registrada. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2000, p. 14.
[3] OLIVEIRA, Maurício Lopes de. Propriedade industrial: o âmbito de proteção da marca registrada. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2000, p. 20.
[4] OLIVEIRA, Maurício Lopes de. Propriedade industrial: o âmbito de proteção da marca registrada. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2000, p. 21.