Indenização pelo uso indevido de marca exclusiva não exige prova de prejuízo

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) confirmou decisão que impede um centro odontológico de utilizar a mesma sigla de um instituto de oncologia que possui o registro da marca no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI).

O centro odontológico, que também foi condenado a pagar indenização por danos morais e materiais, argumentou que o instituto de oncologia não comprovou os prejuízos supostamente sofridos pelo uso da mesma marca e sustentou que a sigla não gera confusão entre os clientes.

A relatora do recurso no STJ, ministra Nancy Andrighi, no entanto, ressaltou que, quando se trata de direito de uso exclusivo de marca, a Terceira Turma tem entendido que o titular do direito não precisa necessariamente demonstrar os prejuízos sofridos para obter a reparação. “A Lei 9.279/96 não exige, para fins indenizatórios, comprovação dos prejuízos sofridos ou do dolo do agente”, explicou.

Exclusividade

O juízo de primeiro grau entendeu que não haveria violação de direito na utilização conjunta da sigla para identificação dos serviços, pois as empresas desempenham atividades distintas.

O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), por sua vez, considerou que as empresas atuam em áreas com similaridade, ambas no campo das ciências médicas. Para o TJSP, mesmo que o produto ou serviço não fosse semelhante e não houvesse a possibilidade de confusão entre o público consumidor, o instituto de oncologia tem a exclusividade do uso da marca por conta do registro no INPI.

A ministra Nancy Andrighi destacou que o artigo 129 da Lei 9.279/96 assegura o direito de exclusividade em todo o território nacional, sendo vedado o uso da marca por terceiros sem autorização prévia de seu detentor.

“Assim sendo, tendo as empresas semelhante objeto social, o uso da mesma marca pode provocar confusão nas mentes dos consumidores. A confusão provocada pode causar danos à reputação de ambas as partes e nos seus respectivos negócios”, concluiu a relatora.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 1674375

COMENTÁRIOS:

Configurado o uso indevido de propriedade de terceiro, seja pela reprodução total ou pela reprodução parcial, configura-se o crime de concorrência desleal. A par disso, há que se reconhecer ao titular da marca  o direito a indenização pelo uso indevido da sua marca. Neste sentido, registre-se o disposto na Lei nº 9.279/96:

Art. 207. Independentemente da ação criminal, o prejudicado poderá intentar as ações cíveis que considerar cabíveis na forma do Código de Processo Civil.

Art. 209. Fica ressalvado ao prejudicado o direito de haver perdas e danos em ressarcimento de prejuízos causados por atos de violação de direitos de propriedade industrial e atos de concorrência desleal não previstos nesta Lei, tendentes a prejudicar a reputação ou os negócios alheios, a criar confusão entre estabelecimentos comerciais, industriais ou prestadores de serviço, ou entre os produtos e serviços postos no comércio.

O Tribunal de Justiça do Distrito Federal foi expresso a afirmar que “Assim, o uso da marca da recorrida pela recorrente, sem autorização e remuneração, está comprovado nos autos, e a conduta configura violação ao direito de uso exclusivo da propriedade (Lei 9.279/96, arts.129 e 130), que enseja o dever de indenizar”[1].

A mesma orientação já foi firmada pelo Superior Tribunal de Justiça, que afirmou: “No caso de uso indevido de marca, com intuito de causar confusão ao consumidor, o entendimento predominante desta Corte é que a simples violação do direito implica na obrigação de ressarcir o dano. Precedentes”[2].No mesmo sentido, afirmou-se que “Na hipótese de uso indevido de marca, capaz de provocar confusão entre os estabelecimentos e consequente desvio de clientela, desnecessária a prova concreta do prejuízo, que se presume”[3].

Conforme se depreende dos precedentes acima citados, os danos materiais não precisam sequer ser comprovados, sendo presumidos pelo uso indevido da marca. Nas palavras de GAMA CERQUEIRA:

“A prova dos prejuízos, nas ações de perdas e danos, merece, entretanto, especial referência. Esta prova, geralmente difícil nos casos de violação de direitos relativos á propriedade industrial, é particularmente espinhosa quando se trata de infração de registros de marcas, não podendo os juízes exigi-la com muita severidade. Os delitos de contrafação de marcas registradas lesam forçosamente o patrimônio do seu possuidor, constituindo uma das formas mais perigosas da concorrência desleal, tanto que as leis, em todos os países, destacam-na como delito específico.

(…)

A simples violação do direito obriga à satisfação do dano, na forma do art. 159 do Co. Civil, não sendo, pois, necessário, ao nosso ver, que o autor faça a prova dos prejuízos no curso da ação. Verificada a infração, a ação deve ser julgada procedente, condenando-se o réu a indenizar os danos emergentes e os lucros cessantes (Cód. Civil, art. 1.059), que se apurarem na execução.

(…)

Não se concebe, realmente, que, provada a existência do ato ilícito, o réu se livre da condenação, alegando que seus atos não causaram prejuízo, ou que o autor não conseguiu prová-los, ou, ainda, que o dano eventual não é ressarcível. Aliás, deve-se observar que, no caso, não se cogita do ressarcimento de danos eventuais, os quais, entretanto, constituem base suficiente para a ação”[4].

Especificamente na órbita da propriedade industrial, a Lei nº 9.279/96 é expressa ao estabelecer critérios para a fixação da indenização dos lucros cessantes:

Art. 208. A indenização será determinada pelos benefícios que o prejudicado teria auferido se a violação não tivesse ocorrido.

Art. 210. Os lucros cessantes serão determinados pelo critério mais favorável ao prejudicado, dentre os seguintes:

I – os benefícios que o prejudicado teria auferido se a violação não tivesse ocorrido; ou

II – os benefícios que foram auferidos pelo autor da violação do direito; ou

III – a remuneração que o autor da violação teria pago ao titular do direito violado pela concessão de uma licença que lhe permitisse legalmente explorar o bem.

A jurisprudência do STJ também é tranquila no sentido de que os danos experimentados pelo titular de marca alvo de contrafação, também podem ter caráter extrapatrimonial, pordecorrer de ofensa à sua imagem, identidade ou credibilidade[5].

[1] TJDFT – 20080110475933APC, Relator SANDOVAL OLIVEIRA, 1ª Turma Cível, julgado em 29/06/2011, DJ 08/07/2011 p. 76

[2]  STJ – REsp 710.376/RJ, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 15/12/2009, DJe 02/02/2010, grifos nossos.

[3] STJ – REsp 1174098/MG, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 04/08/2011, DJe 15/08/2011, grifos nossos.

[4] GAMA CERQUEIRA, João da. Tratado da Propriedade Industrial, v. II, Tomo II, atualizado por Newton Silveira e Denis Borges Barbosa. Rio de Janeiro: Lumen Iuris, 2010, pp. 217 e 290-291.

[5] REsp 1674370/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 03/08/2017, DJe 10/08/2017

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